ENSAIO SOBRE AS MEMÓRIAS DA SEGUNDA GUERRA MUNDIAL NO JAPÃO (1945-1964)
Introdução
A guerra do Pacífico na Ásia iniciou em 7 de dezembro de 1941, quando o Japão atacou a base americana de Pearl Harbor. Esse conflito, entre ambos os países, foi motivado, principalmente, pelo congelamento dos ativos japoneses e o embargo de todas as exportações pelos Estados Unidos, uma das ações mais implicantes para o Japão, porque 80% de seu abastecimento provinha dos EUA e das Ilhas Orientais Holandesas [HASTINGS, 2011]. O embargo sancionado como uma medida hostil contra o imperialismo japonês na Ásia, visto que, a partir de 1931, o país começou seu plano expansionista invadindo a Manchúria.
Para o Japão, as suas ações imperialistas e, consequentemente, a guerra do Pacífico tinham justificativas baseadas no ideal de hierarquia. Acreditava-se que o Japão deveria lutar pelo estabelecimento de uma hierarquia mundial e, assim sendo, que os países se subordinassem a ele, ocupando o seu “devido lugar”, visto que era o único representante de uma nação hierárquica de cima para baixo [BENEDICT, 2014]. Do mesmo modo, objetivava-se despertar a China, “sua irmã retrógada”, pois se via como um irmão mais velho da Ásia e mais desenvolvido, já que teria: “alcançando a unificação e paz em seu território, esmagado o banditismo, construído estradas, consolidado o potencial elétrico e indústria de aço, além de ter educado 99,5% da sua geração em ascensão nas escolas públicas” [BENEDICT, 2014, p. 26]. Além disso, defendia-se que como era pertencente ao Poderoso Oriente, deveria eliminar as grandes potências, como: os EUA, Inglaterra e Rússia, e assumir a liderança para unir todas as nações em um mundo só, firmados numa hierarquia.
Essa justificativa e as ações imperialistas simbolizavam o Japão como macho dominante diante dos lugares invadidos. Contudo, com a perda da guerra para os norte-americanos, essa representação alterou-se e ocorreu uma subjugação, o colocando em um papel feminino: ao mesmo tempo que era representado como uma mulher dócil, que aceita incondicionalmente o desejo dos EUA, era representado também por uma imagem de uma mulher perigosa [IGARASHI, 2011]. O fim da guerra do Pacífico aconteceu depois dos ataques atômicos e a retomada de uma parte da Manchúria e do norte da China pelos soldados soviéticos. Em 6 de agosto de 1945 o avião B-29 EnolaGay lançou em Hiroshima a bomba Little Boy e três dias depois atacaram Nagasaki com a bomba Fat Man.
Com a derrota, em 1945, o Japão sofreu uma crise, uma morte simbólica e perdeu sua narrativa central que o representava como o poderoso do Oriente. Portanto, surgiram memórias sobre a guerra do Pacífico e que apareceram em diversos momentos de sua história [IGARASHI, 2011]. Inicialmente, o Japão do pós-guerra optou por silenciar essas memórias e se distanciar através da adoção do discurso de riqueza material. Segundo Michel Pollak [1989], a memória é seletiva e está aberta à dialética entre a lembrança e o esquecimento, selecionando o que é rememorável e o que dever ser silenciado.
Posteriormente, formou-se uma narrativa fundadora, por ações tanto dos Estados Unidos como do Japão, para tornar aceitável os usos das bombas atômicas e da relação entre os dois países. Os estadunidenses colocaram as bombas e o governo japonês as decisões do imperador como cruciais para o fim da guerra. No Japão transformam Hirohito em herói, assumindo um papel de:
“soberano, mesmo que reticente, iluminado e que tomou uma decisão crucial para salvar o Japão como também todos os seres humanos [...]. Encarando a incerteza do próprio destino, o Imperador disse, supostamente, que: ‘eu não ligo para o que possa acontecer comigo. Eu não posso mais continuar com a guerra, porque eu não aguento mais assistir o sofrimento das pessoas’ [...]” [IGARASHI, 2011, p. 65].
Assim sendo, o
objetivo deste ensaio é analisar como se estabeleceu essas memórias sobre a
guerra no Pacífico e perda do Japão, pensando que as memórias dos eventos são
subjetivas, mas pertencentes aqueles que as rememoram [IGARASHI, 2011].
As memórias da
guerra no Japão
De acordo com John Dower [2005] é possível identificar, nas memórias, cinco padrões que se estabeleceram no Japão, contributivos para a formação da consciência popular e para a construção da História Pública. São eles: 1- A negação; 2- evocação da equivalência moral ou imoral; 3- complexo de vítima; 4- sanitização binacional (EUA-JAPÃO) dos crimes de guerras japoneses; 5- discursos populares reconhecendo a culpa e as responsabilidades do Japão.
As memórias da negação eram fortemente erradicadas nos grupos extremistas de direita e políticos conservadores, mas surgiram também em grupos de burocratas, empresários, jornalistas e acadêmicos nacionalistas. Insistiam em negar que o Japão era um agressor na guerra, buscando justificar, primeiro, pela perspectiva de que os soldados e marinheiros do imperador, impulsionados pelo amor à pátria e por um idealismo oriental entregaram-se em defender a sua nação. Da mesma forma, argumentavam que o Japão teria sido forçado a entrar na guerra devido ao comunismo e as ameaças ideológicas, econômicas e estratégicas da União Soviética, que já haviam se infiltrado na Coreia e na China [DOWER, 2005]. Diante disso, o Japão teria que adotar medidas de autodefesa contra o perigo vermelho (comunismo) e o perigo branco (imperialismo e colonialismo).
Outra questão que ainda é frequentemente negada são os crimes de guerras cometidos pelos japoneses. Partiam da ideia de que o contexto mundial havia entrado em colapso e abriu-se para o caos, acontecendo um conflito mundial testemunhando: “[...] atrocidades inauditas em todas as suas arenas e de todas as partes envolvidas, seria um absurdo apontar o Japão como único responsável pela explosão do conflito na Ásia ou como o único responsável pelos atos de barbarismo na região [...]” [DOWER, 2005, p. 265]. Para eles, culpar apenas o Japão seria o mesmo que perpetuar a visão dos vitoriosos.
Enquanto as memórias de evocação da equivalência moral ou imoral tem como base o julgamento de Tóquio, conhecido como Tribunal Militar Internacional para o Extremo Oriente. Isso por ter sido mal concebido, permitindo a abertura para aqueles que buscavam negar as graves responsabilidades da guerra japonesa. Utilizado pelos revisionistas e conservadores japoneses, justamente por ter funcionado como uma espécie de: “cortina de fumaça para esconder os verdadeiros crimes de guerra e atos de agressão que os japoneses cometeram durante sua guerra de 15 anos [...]” [DOWER, 2005, p. 268]. Emprenharam-se em mostrar que o Japão imperial era um participante inocente do catastrófico contexto ou que não era tão mais culpado do que os outros países [DOWER, 2005]
Já as memórias denominadas de complexo de vítima estavam intimamente relacionadas com a traumática memória de perda da guerra, juntamente com as bombas atômicas em Hiroshima e Nagasaki, além dos estragos ocorridos em 66 cidades do Japão, bem como as mortes de cerca de três milhões de japoneses. Essas memórias eram, ao mesmo tempo, de vitimização como também traumática, tanto que se tornou comum referir-se a esses mortos de guerra como “vitimas”. Igualmente essas memórias deixaram: “[...] aqueles que sobreviveram desprovidos até mesmo do consolo psicológico da vitória. Não poderia haver heróis para o lado perdedor” [DOWER, 2005, p. 270].
Ainda que o Japão não fosse o único país com essa aguda sensação de vitimização, o governo raramente reconheceu as vítimas asiáticas de suas violentas ações e mesmo quando reconhecidas, como vítimas, eram vistas como algo remoto e desconhecido. Inicialmente, ocorreu uma publicidade dos crimes de guerras japoneses deixando muitos indivíduos profundamente chocados com a revelação dos atos violentos de seus soldados japoneses. Entretanto, algumas circunstâncias embotaram o surgimento de um sentimento de responsabilidade mais profundo no Japão: a primeira circunstância foi as dificuldades da vida diária enfrentada pela maioria dos japoneses após a rendição, como a falta de comida e a inexistente infraestrutura de saúde em várias áreas urbanas, resultando em muitos japoneses contraíssem doenças letais [DOWER, 2005].
Outra circunstância foi a Guerra Fria, visto que destruíram-se não apenas as alianças do tempo de guerra, mas também as identificações dos antigos inimigos. O Japão tornou-se central para a estratégia anticomunista americana, tanto militar quanto economicamente e para além disso havia esforços por parte do Japão para se distanciar dos legados da Guerra do Pacífico. Apoiando, dessa forma, a hegemonia estadunidense no Extremo Oriente [DOWER, 2005; IGARASHI, 2011].
As memórias intituladas de sanitização binacional (EUA-JAPÃO) dos crimes de guerras japoneses, são aquelas que buscaram omitir as responsabilidades de crimes japoneses, ações elaboradas tanto pelos EUA como pelo Japão. Parte disso ocorreu no tribunal de Tóquio, em que promotores liderados pelos americanos decidiram ignorar alguns crimes de guerra, como:
“[1] o conhecimento e a responsabilidade do imperador pelos atos de agressão e atrocidades do seu país [2] experiências ‘médicas’ letais conduzidas em pelo menos três mil prisioneiros na Manchúria pela notória ‘Unidade 731’; [3] o recrutamento e virtual escravidão de muitas dezenas milhares de assim chamadas ‘mulheres de conforto’ (ianfu) para servir sexualmente aos soldados e marinheiros do imperador, a maioria delas jovens moças coreanas; e [4] a total extensão do uso de armas químicas na China. À luz das recentes investigações sobre o uso de caucasianos e outros prisioneiros de guerra como escravos nas minas de carvão japonesas e em outras operações deve ser notado que os vitoriosos também decidiram formalmente excluir qualquer representante dos oligopólios zaibatsu do banco dos réus no julgamento dos crimes de guerra do tribunal ‘Classe A’ em Tóquio. Essas omissões são tão fragrantes que não parece ser exagerado falar de negligencia criminosa ou até mesmo de cumplicidade, por parte da própria Promotoria” [DOWER, 2005, p. 275].
Por outro lado, no Japão exoneraram o imperador Hirohito de qualquer responsabilidade das políticas e atitudes tomadas em seu nome, como já exposto. Para isso, os líderes do governo japonês atribuíram o poder autocrático do imperador aos militares, culpando-os por todas as ações. Então, se Hirohito foi absolvido de qualquer responsabilidade, os líderes políticos, que teriam seguido fielmente o imperador, poderiam ser igualmente exonerados de sua responsabilidade política. Lógica que buscou se aplicar igualmente a população japonesa: “já que a vontade dos japoneses era uma extensão da vontade do Imperador. Como o Imperador não era responsável, a população também não o era” [IGARASHI, 2011, p. 76]. Esses acobertamentos binacionais impediram o surgimento de um sentimento profundo sobre as responsabilidades de guerra no Japão.
Apesar de não ter surgido um sentimento profundo de culpabilidade, ainda há as memórias designadas de discursos populares reconhecendo a culpa e as responsabilidades do Japão e que são demarcas por disputa entre a memória oficial e as memórias subalternas, além das inúmeras controvérsias sobre a culpabilidade dos crimes japoneses. Percebe-se que essa disputa de memória e, principalmente, o surgimento mais enfático das memórias subalternas: “constituem uma espécie de ‘contestação da memória institucionalizada’ que tem mantido uma consciência crítica da Segunda Guerra Mundial tão viva no Japão [...]” [DOWER, 2005, p. 282]. Permitindo que se manifestasse na população um sentimento de reconhecimento dos erros do passado e a necessidade de repara-los, diferentemente dos líderes políticos japoneses. É possível notar isso nas pesquisas de opiniões, como a enquete realizada em 1994: “mostrou que 80 por cento dos japoneses entrevistados acreditavam que o governo ‘não havia adequadamente compensado as populações e os países que o Japão havia invadido ou colonizado” [DOWER, 2005, p. 284].
No tocante as controvérsias, nota-se que o conflito apareceu, sobretudo, em diversos debates sobre a revisão constitucional, nos conteúdos dos materiais didáticos e na abordagem de uma: “linguagem apropriada para as ‘desculpas’ oficiais pelas depredações conduzidas pelo Japão Imperial e a missão adequada para as benignamente chamadas ‘forças de autodefesa’ da nação” [DOWER, 2005, p. 282].
É perceptível que no Japão essas memórias sobre a Guerra do Pacífico estão em constante disputa e reaparecem no decorrer da história de acordo com o jogo político estabelecido. Conforme Michel Pollak [1989], as memórias subterrâneas emergem em momentos de crises e se opõe as memórias oficiais, ou seja, a memória nacional. Acentuando o caráter uniformizador e opressor da memória coletiva nacional [POLLAK, 1992].
Percebe-se que essa disputa de memórias está circunscrita em diversos espaços, sejam oficiais ou até mesmo culturais e populares. Um dos espaços oficiais mais utilizado são os livros e textos didáticos, que vem gerando críticas, do exterior, desde a década de 1960, na medida em que buscou-se minimizar os aspectos “tenebrosos” da história moderna do Japão. Outros espaços de disputa são os filmes, sendo uma forma alternativa selecionada pela cultura de massa para se lembrar do passado, em que, até a década de 1960, eles retrataram a perda da guerra. Contudo, isso foi se perdendo e demonstrando que não há mais lugar para nenhuma dessas recordações, em razão de o Japão ter se esforçado para apagar seus traços de liminaridade, através da adoção de um discurso de uma economia de prosperidade crescente [DOWER, 2005; IGARASHI, 2011].
Um exemplo que mostra evidentemente essa disputa por memórias e a transformação do discurso são os filmes do Godzilla. Segundo Yoshikuni Igarashi (2011), na década de 1950 os corpos dos monstros tornaram-se símbolos evidentes para a marca da perda. Os primeiros filmes do Godzilla trazem representações da guerra, retratando eventos ocorridos no período. Como o filme de 1954, dirigido por Ishirō Honda, em que: “[...] o monstruoso corpo de Godzilla corporificava, verdadeiramente, as ameaças nucleares americanas [...]” [IGARASHI, 2011, p. 281]. Embora, não fosse nomeado claramente, os EUA reapareceram com inimigos nesse filme, outro exemplo disso, é a passagem que retrata a paisagem de Tóquio que: “[...] se assemelha ao cenário criado pelos raides aéreos americanos, principalmente, aqueles em Hiroshima e Nagasaki [...]” [IGARASHI, 2011, p. 281].
Posteriormente, surgem diversos outros filmes do Godzilla, no entanto, só prosseguem devido aos caprichos de uma sociedade japonesa que persistia ser prospera sob amparo dos Estados Unidos e que buscava esquecer os mortos de guerra. Contudo, a partir de 1960, a distância entre as situações de produção e as memórias da guerra foi ficando cada vez maior até que desaparecesse, dando espaço para o surgimento do discurso de prosperidade, como exposto anteriormente [IGARASHI, 2011].
Além dos filmes outro espaço é a literatura, tal como as histórias escritas por Akiyuki Nosaka, que tem um teor autobiográfico e retratam a guerra e a derrota do Japão. Uma delas é “O túmulo dos Vagalumes”, considerada importante obra, pois ganhou o prêmio literário Naoki. É uma história que retrata a vida de duas crianças no tempo de guerra: Seita e Setsuko, ambos indefesos e sem ajuda de parentes, acabam sendo obrigados a enfrentar uma sociedade em que cada membro estava interessado apenas na própria sobrevivência. Por serem abandonados pela sociedade, acabam rejeitando-a e vivem à margem dessa insana guerra, apesar de não ser considerado um ato de resistência, a independência dos irmãos garante imunidade da culpa, porque ambos se recusaram a participar desses eventos e pagam o preço com as próprias vidas. As mortes miseráveis de Setsuko e Seita simbolizam a irracionalidade da guerra, visto que eles sofreram por terem mantido sua inocência [IGARASHI, 2011].
A história é demarcada pelo sofrimento que representa a máxima vitimização da guerra, já que as duas crianças eram vítimas de forças além do controle e de sua compreensão. Por fim, a utilização das imagens de vaga-lumes pelo autor configura a noção de passado, dado que: “na década de 1960, os vaga-lumes estavam desaparecendo rapidamente da paisagem japonesa por causa da poluição industrial e do uso de pesticidas [...]” [IGARASHI, 2011, p. 421]. Demonstrando que as marcas das perdas podem ser apagadas, entretanto, as memórias não desaparecerão tão facilmente.
Há também os espaços que transitam entre o oficial e o culturalmente popular, como o discurso propagado na abertura das olimpíadas de Tóquio em 1960. O discurso era composto principalmente de uma narrativa de recuperação e exaltava o Japão, abordando a história japonesa desde a destruição da guerra, em 1945, até a prosperidade de 1960. Nessa abertura, as memórias da destruição que assombrava o Japão do pós-guerra foram admitidas, justamente porque se ancorou nessa narrativa de recuperação [IGARASHI, 2011]. Sendo assim, não destacaram a guerra em si, mas a luta do pós-guerra japonês para lidar com a destruição e o sucesso que alcançaram posteriormente. Posto isto, é comum que se negue e silencie a participação do Japão na Segunda Guerra Mundial, apoderando-se de um discurso de harmonia e paz, optando por demonstrar apenas a vitória e desenvolvimento econômico do país.
Considerações
finais
Pode-se perceber que as memórias sobre a Guerra do Pacífico entram em constante conflito, disputando espaços e sendo utilizadas de acordo com o poder político estabelecido. A princípio, o Japão preferiu adotar um discurso de silenciamento, ignorando sua participação e as responsabilidades dos crimes de guerra, escolhendo frisar o desenvolvimento e a riqueza material. Esse discurso é ligado mais a memória oficial e foi estabelecido como a narrativa fundadora. Entretanto, em momentos de crise as memórias subalternas ressurgem e contestam a memória oficial. Um exemplo explicito disso é o padrão de memória “discursos populares reconhecendo a culpa e as responsabilidades do Japão”, que permitiu a manifestação de um sentimento de reconhecimento dos erros do passado e a necessidade de repará-los. Contestando assim o padrão de memória que negava os crimes de guerras japoneses e/ou tentava justificar essas ações através do contexto caótico que o mundo estava presenciando.
Ademais, os espaços são constantemente disputados por essas memórias, sejam espaços oficiais ou até mesmo os culturalmente populares, isso porque pertencem ao âmbito público e possuem um grande alcance, interferindo na formação da consciência popular e na construção da história pública japonesa. Portanto, a memória é manipulada conforme os interesses políticos postos. Por fim, é característico na formação da consciência japonesa essa manipulação, pois há dois momentos cruciais na construção da narrativa fundadora: o período de 1950, que foi um momento marcado pelas estratégias de como recordar as memórias da guerra e a sua perda, e o período de 1960, que decidiu-se substituir essas memórias pelo discurso de prosperidade, colocando, muitas vezes, as dificuldades enfrentadas como condições necessárias para o desenvolvimento do Japão.
Referências
Luana Martina
Magalhães Ueno é mestranda em História Social pela Universidade Estadual de
Londrina (UEL). Membro do Grupo de Pesquisa sobre Culturas Orientais (GPECO) e
do Laboratório de Pesquisa de História e Memória Social (LAHMEM).
BENEDICT, Ruth. O Crisântemo e a espada: padrões da cultura japonesa. São Paulo: Perspectiva, 2014.
DOWER, John.
“TENDENCIA A NÃO SER AMADO”: guerra e memória no Japão. In: BARTOV, Omer; GROSSMANN,
Atina; NOLAN, Mary. Crimes de Guerra: culpa e negação no Século XX. Rio de
Janeiro: Difel, 2005.
HASTINGS, Max.
Inferno: O mundo em guerra 1939-1945. Rio de Janeiro: Editora Intrínseca Ltda,
2011.
IGARASHI,
Yoshikuni. Corpos da memória: narrativas do pós-guerra na cultura
japonesa (1945-1970). São Paulo: Annablume, 2011.
POLLAK, Michel.
Memória, Esquecimento, Silêncio. Estudos Históricos, Rio de Janeiro, vol. 2, n.
3, 1989, p. 3-15.
POLLAK, Michael.
Memória e Identidade social. Rio de Janeiro: Estudos Históricos, vol. 5, n. 10,
p. 200-212, 1992.
Bom dia! Ótimo trabalho, parabéns. Sei que o assunto foge do tema, mas gostaria de saber como é lecionado o tema da II Guerra nas escolas japonesas na atualidade. Obrigado.
ResponderExcluirOlá, Luiz.
ExcluirObrigada!
Olha, atualmente não sei como está exatamente, mas acredito que ainda não são trabalhadas algumas questões como as agressões do Japão em relação à China e a Coréia do Sul. É perceptível um certo revisionismo historiográfico, ou até mesmo um silenciamento, sobre o massacre de Nanquim, por exemplo.
Obrigado!
ExcluirEste comentário foi removido pelo autor.
ResponderExcluirOlá, seu tema me chamou muito atenção por focar na questão da memória do pós guerra e do papel do Japão na Segunda Guerra Mundial. Lendo o seu texto, vi uma citação que me chamou bastante atenção, o fato de você ter usado uma animação para complementar o seu texto. O túmulo de Vagalumes, como você descreceu e usou como apoio na sua argumentação foram ótimos!
ResponderExcluirA minha pergunta é: Como você vê a questão do uso de animações japonesas como fonte histórica? Visto que alguns ainda possam achar um meio não convencional de referência.
Mais uma vez, parabenizo pelo excelente texto! Foi uma ótima leitura!
Att. Eduarda Christine Souza Pucci
Olá, Eduarda.
ExcluirObrigada!!
A utilização de animações como fonte histórica é muito importante, pois, assim como a literatura e o cinema, expressa tanto sobre um momento passado, caso do Túmulo dos Vagalumes, como sobre o período em que está sendo produzido a obra. Acredito o campo de pesquisas que utilizam os mangás e animes como fonte está expandindo-se cada vez mais. O que é muito interessante, visto que trazem outras perspectivas sobre os eventos históricos.
Luana Martina Magalhães Ueno
Parabéns pelo texto!
ResponderExcluirA tipologia de padrões contributivos para a formação da consciência popular e da História Pública de Dower foi ótima e muito bem apresentada para entender as memórias da guerra. Foi possível situar os grupos sociais dentro do contexto histórico e suas intencionalidades.
Despertou-me muito interesse e curiosidade, as memórias subalternas que contestam a memória oficial. A citada pesquisa de opinião de 1994 com 80% dos japoneses criticando o governo exemplificou bem a contestação. Por acaso, você tem conhecimento de pesquisas de opinião com esse caráter mais recentes? E poderia indicar outros exemplos de formas de contestação? (pode ser em qualquer espaço: oficial, cultural, popular, etc.)
Robson Hideki Mori
Olá, Robson.
ExcluirMuito Obrigada!!
Como é um ensaio, acabei não me aprofundando muito sobre como estão essas questão na atualidade. Mas sei que ainda há recusas sobre os ataques japoneses em relação aos outros países asiáticos. Sei de um dirigente da televisão japonesa chamado Naoki Hyakuta que negou os massacres que ocorreram em Nanquim. Ainda há essa negação por parte de alguns japoneses.
Sobre outros exemplos de contestação dessa memória oficial podemos encontrar na literatura, na fotografia, nas artes. Como o fotógrafo Ken Domon, apesar de ter sido cooptado pelo Estado durante a Segunda Guerra Mundial para auxiliar nas propagandas de guerra, ele criticou o governo japonês. Por exemplo, a sua publicação "Hiroshima" retrata os efeitos da bomba atômica e os efeitos persistentes da guerra, criticando não somente os Estados Unido, mas também o governo imperial, argumentando que através das ideologias nacionalistas teria enganado a população. Outros exemplos, são os artistas Noboru Kitawakim e Chozaburo Inoue, em que criticaram e representaram o cenário pós-guerra. Se for do seu interesse, te indico um livro intitulado de "The confusion era: art and culture of Japan during the Allied Ocupation, 1945-1952".
Luana Martina Magalhães Ueno
O certo é Noburu Kitawaki.
ExcluirO ensaio está ótimo e realmente não cabia aprofundar para a atualidade.
ExcluirMuito obrigado pelas indicações e parabéns novamente pelo texto!
Robson Hideki Mori
Olá,
ResponderExcluirMeus parabéns pelo texto, está muito claro, interessante e esclarecedor.
Os embates e disputas de memória são sempre temas muito pertinentes, assim como os apagamentos e esquecimentos. Você comenta em dado momento do texto sobre os esquecimentos e negações dos crimes de guerra cometidos pelos japoneses. Na hora me veio em mente a questão das mulheres de conforto. Gostaria de saber se teria alguma informação sobre como tal caso afetou as relações entre Japão e Coreia do Sul no pós-guerra?
Agradeço desde já a atenção e o texto,
Rodrigo Galo Quintino
Este comentário foi removido pelo autor.
ExcluirOlá, Rodrigo!
ExcluirMuito obrigada!!
No Japão raramente é falado sobre as mulheres de conforto, sendo até negado esses eventos. Até hoje não houve uma reparação por parte do governo japonês aos países como a China e a Coreia do Sul. Como expus no texto, é comum uma justificação de que essas ações aconteceram devido ao contexto, que os países que participaram da Segunda Guerra Mundial cometeram diversas atrocidades, então, o Japão não seria mais culpado do que os outros. Sugiro que essa justificativa é utilizada para encobrir as atrocidades cometidas pelos soldados japoneses.
O que eu percebo é que, de certo modo, até hoje a Coreia do Sul, como a China, esperam uma retratação por parte do Japão. Acredito que há memórias traumatizantes na Coreia e se tornou um assunto sensível.
Luana Martina Magalhães Ueno
Olá, gostei muito de seu texto. Compreendi que as memórias sobre o imperialismo japonês segue sendo uma memória suprimida e negada, mas já li também uma vez que até mesmo as memórias sobre a bomba atômica em Hiroshima e Nagazaki são suprimidas e justificadas. Você pode falar um pouco sobre isso?
ResponderExcluirGeovana Siqueira Costa
Olá, Geovana.
ExcluirObrigada!!
Isso ocorreu mesmo, devido ao governo japonês preferir suprimir as memórias de guerra e focar em um discurso de prosperidade. Seria uma estratégia para tornar-se aceitável a ocupação norte-americana e a relação entre ambos países. Assim, em alguns, momentos foi preferível silenciar os efeitos da guerra e as bombas atômicas. Sugiro também que pode ter sido uma tática para lidar com as memórias da perda da guerra, pois acredito que tenham virado uma espécie de vergonha, já que o Japão se considerava a maior potência imperial.
No entanto, é notável que apesar da tentativa do governo em silenciar e construir uma memória oficial, há as memórias subterrâneas. Encontramos resistências e a emersão dessas memórias na cultura, como no cinema, na literatura, nos mangás e animes. Como por exemplo, o mangá e o anime "Hadashi no Gen", em que retrata a bomba atômica em Hiroshima de forma bem sangrenta.
Podemos perceber, então, disputas de memórias, porque também há as memórias de "vitimização", em que buscam encobrir as atrocidades cometidas pelos soldados japoneses nos outros países asiáticos por meio das bombas, enfatizando os sofrimentos e as mortes.
O Japão no pós-guerra é marcado por essas disputas de memórias e conflitos de identidade, visto que muitos buscaram reconstruir uma "identidade japonesa".
Luana Martina Magalhães Ueno.
Olá, Luana!
ResponderExcluirParabéns pelo teu trabalho, muito interessante e esclarecedor.
Sou gaúcha, e mesmo que em proporções e situações totalmente diferentes, fico pensando como nós gaúchos criamos e reverberamos o discurso de honra mesmo diante da derrota na Revolução Farroupilha (se bem que muitos gaúchos nem sabem que perdemos a guerra).
Existem dados de que parcela da população lida com o pós-guerra como algo a ser esquecido e que parcela da população trata do assunto como algo a ser explicitado e corrigido?
Obrigada!
Letícia Mayer Borges
Primeiramente gostaria de parabenizá-la pelo ótimo texto. Muito importante essa discussão sobre o Japão na segunda guerra, visto que na maioria das vezes, o tema é abordado em sala de aula de forma superficial. A ideia de trabalhar temas a partir da memória é muito importante e envolvente.
ResponderExcluirMinha pergunta é mais uma curiosidade: Até hoje há essa falta de responsabilidade japonesa por parte do governo, já que pelo que você citou, a população faz o reconhecimento dos erros e acredita que países como a Coreia, por exemplo, não foram reparados? Nenhum outro país cobrou uma medida mais responsável do governo japonês após o fim da guerra ou até mesmo atualmente?
Muito Obrigada!!
Yvylyn Chagas Alcântara